10 de março de 2010

A DEPORTAÇÃO: INCURSÃO AO PENSAMENTO DE DANIEL

E o Senhor lhe entregou nas mãos a Jeoiaquim, rei de Judá, e uma parte dos vasos da casa de Deus; e ele os levou para a terra de Sinar, para a casa do seu deus; e os pôs na casa do tesouro do seu deus. (Daniel 1:2)
É em primeiro lugar, sem dúvida, o acontecimento da usurpação da parte de Babilónia que é denunciado! O povo de Deus e o s utensílios sagrados do templo tornaram-se propriedade de Nabucodonosor.
Para alcançar toda a dimensão e até a importância deste episódio, torna-se necessário situá-lo no contexto histórico.
Estava-se no ano 605 a.C., Jerusalém, a capital de Judá, foi cercada pelos Caldeus e os seus habitantes são deportados. Um século antes (722 a.C.), o reino irmão do Norte tinha sofrido a mesma sorte por parte dos Assírios (2ª Reis 17:4-23). O reino de Judá representa, portanto, o último Estado que subsiste do grande reino do rei Davi.
De facto, com a morte do rei Salomão, segue-se a revolta, o reino de Davi é dividido em dois. As dez tribos do Norte organizam-se sob o nome de Israel. As três do Sul (Judá, Benjamim e Levi) unem-se sob o nome de Judá.
No seguimento deste sisma, e para além das lutas fratricidas que opuseram os dois reinos, a história exterior de Israel e de Judá apresenta mais ou menos as mesmas características. Acantonadas entre as duas superpotências da época, o Egipto ao sul e Assíria e Babilónia ao norte e a este, Israel e Judá são frequentemente tentadas a aliar-se ao poder do Sul para resistir ao Norte; enfim, os dois reinos (Israel e Judá) experimentarão o mesmo destino num cenário parecido. É no entanto a aliança com o Sul que desencadeará a sua queda.
Em Israel, o rei Oséias alia-se ao Egipto para tentar libertar-se do jugo da Assíria. Segue-se uma campanha desastrosa durante a qual o território israelita é ocupado, Oséias é preso, acorrentado e lançado na prisão (2ª Reis 17:4). Samaria, a capital, resiste durante três anos, finalmente cai no ano 722. o rei da Assíria, Sargão, aplica a politica da deportação começada pelo seu avô Tiglate-Piliser III (746-727). Os israelitas são deportados para as regiões orientais da Assíria e substituídos por colonos assírios de originários de Babilónia e de outras partes, formarão os futuros samaritanos. A maioria do povo hebraico desapareceu nesta tormenta. Dez tribos sobre treze são assimiladas na massa assíria.
O reino de Judá com as suas três tribos sobrevivem durante algum tempo, mas vão conhecer a mesma sorte. Os habitantes de Judá são também exilados por se terem aliado ao Egipto.
É desta maneira que para Babilónia são arrastados numa imensa viagem Daniel e os seus companheiros, bem como milhares de outros. A viagem é feita sob grande pressão da parte dos soldados de Nabucodonosor. Muitos prisioneiros morrem pelo caminho. O percurso é também um exame onde o rei e os seus conselheiros vão observando os prisioneiros e percebendo onde estão os mais nobres, inteligentes e fortes. Não devemos esquecer que são mil e quinhentos quilómetros que serão feitos, o caminho inverso de Abraão o pai da fé. E é nesta mesma estrada que mais uma vez Deus vai suscitar os que escutam o Seu chamado e se identificam com os princípios do Céu. Há seguramente uma diferença, Abraão foi voluntariamente, Daniel e os seus companheiros são arrancados da sua terra como árvores que se arrancam com violência, atrás não ficam memórias a não ser de raízes que se quebram com terrível sofrimento.
Assim, o seu passado, a sua esperança, a sua identidade, os seus valores, tudo é agora comprometido. No exílio terão que aprender a esquecer quem eles eram. Este é o objectivo principal do opressor. Deportavam-se os habitantes para os sujeitar, os oprimir. Ocupados a adaptar-se, estrangeiros em inferioridade, perdidos na massa de outros estrangeiros que com eles são deportados, tornam-se indígenas revoltados. Por fim, acabariam por se tornar fiéis servidores da nação – como todos os outros. Eram assimilados.
Mas a prova que os magoa mais é que para além dos seus destinos particulares, o que se trata é do fim de Judá, e isto significa de facto os últimos representantes dos filhos de Jacob.
O fim que os ameaça não é só de ordem politica; esta ameaça comporta uma ameaça de dimensão espiritual e cósmica. Com a desaparição da última testemunha de Deus, na perspectiva bíblica é a sobrevivência do mundo que é ameaçada. Porque Babilónia pretende substituir Jerusalém (quem está por detrás dos bastidores?), a implicação religiosa desta usurpação é evidente. De uma forma bem significativa o texto sublinha por três vezes o facto de que Nabucodonosor transportou os utensílios do templo de Deus para o seu próprio templo em Babilónia.
“E o Senhor lhe entregou nas mãos a Jeoiaquim, rei de Judá, e uma parte dos vasos da casa de Deus; e ele os levou para a terra de Sinar, para a casa do seu deus; e os pôs na casa do tesouro do seu deus.” Daniel 1:2.
Este texto é de capital importância, direi mesmo, há nele um tom dramático e Daniel é bem consciente que algo de tremendo se passa: o rei Nabucodonosor queria não só apagar o povo de Judá da face da terra, mas também, o Deus de Judá. O pior, o povo tinha chegado a um ponto de apostasia, que Deus exerce juízo: “o Senhor lhe entregou nas mãos a Jeoiaquim, rei de Judá,” (v. 2). É o cumprimento das profecias que tinham sido pronunciadas pelos antigos profetas, mas também um apelo ao arrependimento (Isaías 39:5-7; Jeremias 20:5).
Sou dado a pensar que vivemos um tempo muito semelhante. Estás tu pronto para ser como Daniel, no caminho da deportação a estar em sintonia com Deus e perceberes os sinais?

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