O apóstolo João evidentemente proclama somente um amor cristão que consome o pecado na vida dos crentes. Quando os cristãos estão realmente em Cristo, e Cristo neles, eles andarão “na luz, como Ele está na luz” (1João 1:7). “Aquele que diz: Eu o conheço e não guarda os seus mandamentos é mentiroso, e nele não está a verdade. Aquele, entretanto, que guarda a sua palavra, nele, verdadeiramente, tem sido aperfeiçoado o amor de Deus. Nisto sabemos que estamos nele: aquele que diz que permanece nele, esse deve também andar assim como ele andou.” (1João 2:4-6).
Assim, para João, perfeição é mais do que vida sem pecado; perfeição é uma comunhão moral e um relacionamento de amor dinâmico da alma com Cristo, revelando o mesmo carácter de santo amor como Cristo. Então, não haverá nenhum temor no coração para o Dia do Julgamento, ou vergonha quando Cristo aparecer na Sua santa glória: ” Nisto é em nós aperfeiçoado o amor, para que, no Dia do Juízo, mantenhamos confiança; pois, segundo ele é, também nós somos neste mundo. No amor não existe medo; antes, o perfeito amor lança fora o medo. Ora, o medo produz tormento; logo, aquele que teme não é aperfeiçoado no amor. Nós amamos porque ele nos amou primeiro.” (1João 4:17-19; ver também 2:28).
João enfatiza a verdade de que o amor cristão não é o fluxo natural do coração humano, mas o dom redentor de Cristo no cristão, que só pode amar desinteressadamente porque ele foi amado primeiro num maior amor por Cristo. O perfeito amor do cristão é o conceito que João tem de perfeição em acção. Isso origina-se de uma real união de amor da alma com Deus e Cristo. Portanto, aquele que é nascido de Deus não pode pecar ou odiar. João baseia a impossibilidade de pecar do crente, não no cristão como tal, mas na presença mantenedora de Cristo que, no mais alto sentido, é nascido de Deus (1João 3:9). “Sabemos que todo aquele que é nascido de Deus não vive em pecado; antes, Aquele que nasceu de Deus o guarda, e o Maligno não lhe toca.” (1João 5:18).
Conquanto a alma esteja unida com Cristo e o Espírito de Cristo habita nele, esta alma não pode pecar, diz o apóstolo em 1João 3:9. O andar do cristão regenerado na luz não implica, contudo, numa consciência ou sentimento de santidade. Pelo contrário, o andar na luz significa uma contínua dependência da graça mantenedora e perdoadora de Deus.
É interessante que João usou o tempo presente quando ele escreveu aos cristãos baptizados: “Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça.” (1João 1:9). Por outras palavras, a vida vitoriosa do cristão não é o resultado automático de alguma natureza sem pecado nele. Não há justiça inerente no cristão antes da sua glorificação final no dia de Deus. Portanto, ele pode cair em pecado de novo, como aparece na consolação de João: “Filhinhos meus, estas coisas vos escrevo para que não pequeis. Se, todavia, alguém pecar, temos Advogado junto ao Pai, Jesus Cristo, o Justo.” (1João 2:1).
Longe de estar escrita como uma recusa para pecar ou para andar nas trevas, esta mensagem confortadora revela a consciência de que nos filhos renascidos de Deus a velha e pecaminosa natureza continua a operar, não deixa de lutar pela supremacia. O conhecimento de inerentes concupiscências da carne e dos olhos (1João 2:16) conduzirá o crente a um profundo arrependimento do coração e auto-condenação. Somente a confiança implícita na palavra de absolvição de um Deus que “é maior do que o nosso coração” (1João 3:20), enquanto andando em amorável obediência a Ele, poderá tranquilizar o coração diante d´Ele (1João 3:19).
Quando João distingue entre pecado mortal e pecado não mortal (1João 5:16,17), ele está continuando a doutrina do pecado do velho concerto, que diferenciava distintamente entre deliberado, presunçoso pecado e pecado inconsciente, não intencional que mais tarde motivava o arrependimento (Núm. 15:27-31; Sal.19:13,14). O apóstolo deseja esclarecer finalmente, que o cristão é guardado do pecado mortal ou presunçoso porque ele está a ser liberto desse caminho de pecado pela habitação do Espírito de Cristo. O filho de Deus não está mais sob o poder dominante do mal, como o mundo ainda está (1João 5:18-19). Ele está agora a viver em Cristo (v. 20), participando do amor de Cristo com seus companheiros crentes numa comunhão santa e feliz (1João 1:3-4).
Dr. Hans K. LaRondelle, A Ideia Bíblica de Perfeição.
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