25 de janeiro de 2010

SÓ 144 000! A SÉRIO?

“E ouvi o número dos que foram assinalados com o selo, cento e quarenta e quatro mil de todas as tribos dos filhos de Israel.” Apocalipse 7:4
“E olhei, e eis o Cordeiro em pé sobre o Monte Sião, e com ele cento e quarenta e quatro mil, que traziam na fronte escrito o nome dele e o nome de seu Pai.” Apocalipse 14:1

OS 144 000.
É um tema favorito de “conversa de salão” – particularmente nas tardes de Sábado – entre os adventistas, mas não é, de forma alguma, uma brincadeira.
Centra-se num número místico que estimula a imaginação, mas não é um número a ser tomado de ânimo leve.
Esse número emerge de um estudo aprofundado das Escrituras, mas a conversa inclui, inevitavelmente, o pensamento e os comentários da mensageira profética adventista, Ellen White.
Ler de relance os escritos de Ellen White sobre este assunto pode desanimar qualquer tentativa de compreender o que o número 144 000 significa realmente para os crentes. Em 1901, ela escreveu: “Não é a Sua (de Deus) vontade que eles entrem em controvérsia sobre questões que não ajudarão espiritualmente, tais como ´Quem fará parte dos 144 000?´. Isso, os eleitos por Deus saberão, inquestionavelmente, dentro de pouco tempo.” (1)
A palavra “cotrovérsia” dá-nos uma ideia daquilo que ela estava a combater.
Para compreendermos o significado e a importância dos 144 000, é melhor que ponderemos cuidadosamente sobre a teia de palavras em que o assunto é focado.
Normalmente, chamamos a isso contexto. Afinal, o significado é inseparável das relações ou dos relacionamentos.
O número 144 000 aparece apenas duas vezes nas Escrituras – ambas no livro de Apocalipse, e em contextos importantes. Encontramo-lo primeiro entre o sexto e o sétimo selos, antes da Segunda Vinda vista como o dia da ira, o dia da destruição daqueles que se opõem a Deus (Ap. 7:4). A segunda vez, em Apocalipse 14, é antes da mensagem dos três anjos e da segunda vinda de Cristo.
Consequentemente, faz sentido supor que o número designa uma entidade do tempo do fim – o povo de Deus durante a última fase da história deste mudo.
A questão é: Serão os 144 000 um subgrupo especial do povo de Deus, ou será este número uma representação simbólica de todo o povo de Deus? Subjacentes a estas questões estão os conceitos do acesso ao selamento e à salvação, após ter sido atingido o número 144 000, e a questão mais profunda da arbitrariedade dos decretos de Deus ou mesmo a natureza moral do Seu carácter.
Os intérpretes que consideram o número literal – especialmente no mundo Evangélico – normalmente afirmam que o mesmo se refere a judeus que aceitam o evangelho e que contribuirão para a partilha do mesmo com outros judeus. Sugerem que o ritmo agrícola dos primeiros frutos – bem conhecido do antigo Israel – apoia esta maneira de ver.
Contudo, há várias indicações de que é um número simbólico, que não deve ser interpretado literalmente. A própria natureza do número sugere o seu simbolismo:
144 000 é 12 x 12 x 1000. Mas, para compreender o seu significado, temos de explorar a rede de palavras, temas e motivos associados ao seu contexto.
1- Os 144 000 são associados com a ideia de estar em pé.
A primeira ocorrência do número 144 000 é uma resposta a uma das quatro questões encontradas na série de selos. Pessoas aterrorizadas gritam às montanhas e às rochas: “Caí sobre nós, e escondei-nos do rosto daquele que está assentado sobre o trono, e da ira do Cordeiro; porque é vindo o grande dia da sua ira; e quem poderá subsistir?” (Ap. 6.16,17).
Mas há mais questões a responder. Primeiro, quem é digno? (Ap. 5:2); até quando? (Ap. 6:10); e, finalmente, quem são eles e donde vêm? (Ap. 7:13).
Os 144 000 podem ficar em pé porque adoram o Cordeiro. Para além dos anjos que estão em pé no livro de Apocalipse, os seres humanos são capazes de estar em pé porque o Cordeiro está em pé. Apocalipse 5 diz-nos que o Cordeiro foi morto, mas está em pé. Isso refere-se à morte e à ressurreição de Cristo em linguagem apocalíptica. O conceito de vitória está no centro de toda a mensagem do capítulo cinco. Sem a vitória do Cordeiro, não existe outra vitória.
Não é por acaso que Apocalipse 14, quando se refere aos 144 000, os descreve como estando em pé com o Cordeiro no Monte de Sião e que seguem o Cordeiro por onde que vá (Apoc. 14:1-5). Dentro do contexto dos primeiros sete capítulos, aqueles que estão em pé são os que saíram vencedores das diversas situações descritas nas cartas enviadas às sete igrejas. O Espírito convidava os crentes a converterem-se a manterem-se na fé e em fidelidade para com o Senhor Jesus Cristo. Portanto, para podermos continuara estar em pé, temos de ouvir o que o Espírito diz às igrejas.
2- Os 144 000 estão poupados e selados.
No Velho Testamento, os fiéis que foram poupados no julgamento, especificamente da vinda do dia de Yahweh, são descritos de várias maneiras. Um cenário importante é relatado em Ezequiel 9, onde refere os selados e poupados como sendo os que suspiram e gemem por causa das abominações que estão a ser cometidas no meio de Jerusalém. Em Ezequiel 14:12-23, o remanescente justo de Israel é salvo da condenação. A sua atitude, que está longe de ser de justiça própria, é importante. O que sabemos sobre este remanescente justo é que tem uma atitude de profunda contrição por causa da apostasia existente entre o povo de Deus.
Ser selado ou marcado pode referir-se a várias ideias, tais como posse, mas o que se encaixa mais naturalmente no contexto de Apocalipse 7 é a protecção da ira de Deus e do Cordeiro. Falando sobre a dedicação dos 144 000 a Deus, Ellen White escreveu: “Aqueles que têm, na sua testa, o selo do Deus infinito considerarão o mundo e os seus atractivos como estando subordinados aos interesses eternos.” (2)
3- Os 144 000 são chamados servos.
Em Apocalipse 7, os 144 000 são chamados servos. No livro de Apocalipse, a palavra “servo” tem uma conotação de adoração. O seu serviço para Deus não se relaciona com realidades sócio-económicas, mas antes realça uma realidade religiosa ou de culto.
A conotação de adoração deste termo leva-nos de volta ao principal objectivo de Deus conforme é revelado nesse livro: fazer de homens e mulheres de todas as tribos, e línguas e nações, sacerdotes que possam entrar no templo escatológico e adorar, eternamente, Deus, o Criador e Redentor. Subentende-se que estes servos vivem exclusivamente para Deus e para o Seu reino.
Informações mais detalhadas sobre as funções do grupo do tempo do fim podem ser encontradas em Apocalipse 14. O nome do Cordeiro e do Pai está escrito na testa dos membros desse grupo. A ideia da pertença está representada pela escrita dos nomes. Estas pessoas foram redimidas e têm as
Qualificações para aprender um cântico de redenção. Podemos legitimamente deduzir, do contexto de Apocalipse 12-15, que os 144 000 saíram vitoriosos sobre a besta, a sua imagem e a sua marca. (3)
A sua lealdade e dedicação a Deus são representadas por várias imagens. Estes crentes são virgens – incorruptos. Estas imagens simbólicas são uma forma de expressar que o povo de Deus dos últimos dias é dedicado de alma e coração a Deus, tal como uma noiva ao seu noivo. Por outras palavras, são cônjuges fiéis, seguindo o Cordeiro por ode quer que vá.
Uma imagem agrícola também é usada para representar o seu valor para Deus como sendo os primeiros frutos. Mais ainda, uma reflexão sobre a rede contextual daqueles que estão do lado de Deus mostra a sua adesão aos valores designados como mandamentos de Deus e ao testemunho e fé de Jesus.
Concluindo: O que quer tudo isso dizer?
O número 144 000 é um número simbólico que se refere à totalidade do povo de Deus que passará pelas grandes tribulações e decepções do tempo do fim. Ele será vitorioso sobre os desafios do tempo do fim, orquestrados pela trindade satânica descrita em Apocalipse 12 e 13 – o dragão, que imita Deus Pai, o anticristo, e o falso Espírito Santo.
Ellen White, longe de nos desencorajar de qualquer tentativa de compreender as características e funções dos 144 000, fez a seguinte advertência: “Aqueles que o Cordeiro guiará pelas fontes de água viva, e de cujos olhos limpará todas as lágrimas, serão os que estão agora a receber o conhecimento e a compreensão revelada na Bíblia, a Palavra de Deus. (4)
Além disso, ela afirma: “Não devemos imitar nenhum ser humano. Nenhum ser humano é suficientemente sábio para ser nosso exemplo. Devemos olhar para o homem Jesus Cristo, que é completo em perfeição de justiça e santidade. Ele é o autor e consumador da nossa fé. É o homem padrão. A Sua experiência é a medida da experiência que devemos obter. O Seu carácter é o nosso modelo. Tiremos, então, a nossa mente das perplexidades e dificuldades desta vida, e fixemo-la n´Ele, para que ao contemplar possamos ser mudados à Sua semelhança. Podemos olhar para Cristo com confiança. Podemos olhar para Ele com segurança; pois Ele é omnisciente. À medida que olhamos para ele e pensamos n´Ele, Ele será formado dentro de nós, a esperança de glória.” (5)
Mas a última exortação no contexto é a que tem maior significado: “Tentemos, com todo o poder que Deus nos deu, estar entre os cento e quarenta e quatro mil.” (6)
Em essência, a adesão às Escrituras como guia infalível num mundo de ideologias, filosofias e religiões em competição; e emulação de Cristo; e a determinação de Lhe sermos leais seja qual for o custo, são as marcas distintivas do povo de Deus dos últimos dias. Estão selados para uma vida eterna de adoração e companheirismo com o Deus de amor – Pai, Filho e Espírito Santo.
Os 144 000 têm uma ligação orgânica com o remanescente do capítulo 12. a sua devoção a Cristo é reminiscente do facto de que têm as características do remanescente na guarda dos mandamentos de Deus e da fé de Jesus Cristo (Ap. 12:17). Eles adoram Cristo total e completamente. Apocalipse 12:11 diz que eles venceram o dragão “pelo sangue do Cordeiro e pela palavra do seu testemunho”. Qualquer crente do tempo do fim pode fazer parte deste número.
O mesmo Deus que quer que todos os povos saibam da verdade e sejam salvos (1ª Tim. 2:3,4) não está a limitar, caprichosamente, o número de remidos. O selamento e a salvação no tempo do fim estão abertos para todos.
Referências:
(1) Ellen White, Mensagens Escolhidas, vol. 1, p. 174
(2) Ellen White, The Advent Review and Sabbath Herald, 13 de Julho, 1897.
(3) Ellen White, O Grande Conflito, pp. 539, 540.
(4) Ellen White, The Advent Review and Sabbath Herald, 9 de Março, 1905, conforme citado no The SDA Bible Commentary, vol. 7, p. 970.
(5) Ibid.
(6) Ibid.

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