21 de fevereiro de 2010

CARTAS ABERTAS AS 7 IGREJAS: SHABBAT

“Eu fui arrebatado em espírito no dia do Senhor, e ouvi por detrás de mim uma grande voz, como de trombeta.” (Ap. 1:10
Ora, esta visão do Deus que virá, João recebe-a justamente no “dia do Senhor” (Ap. 1:10). Os cristãos que lêem esta passagem pensam imediatamente no domingo. Mas esquecem-se que é um Judeu que fala, alguém nutrido pelas Escrituras Antigas (Hebraicas) e bem enraizado na religião dos seus pais. Além disso, a expressão “dia do Senhor” para designar o domingo não é confirmada pela história antes do IIº século; e ainda assim, ela é muito especial porque nos escritos da época não há nenhuma referencia a que o “dia do Senhor” seja o domingo.
Seria razoável pensar que o “dia do Senhor” de que fala João se aplique ao sábado, também chamado “dia do Senhor” (ou “dia de Adonai”) nas Escrituras do Antigo Testamento (o nome Adonai, “Senhor”, é a leitura tradicional do nome de Deus YHWH, geralmente traduzido por “o Eterno” – Êxodo 20:10; Lev. 23:3; Deut. 5:14).
Por outro lado, a apetência do Apocalipse pelo número 7 torna completamente óbvia esta evocação ao dia do sábado, sétimo dia, no início do livro, como introdução aos repetidos 7 que se vão seguir. Esta interpretação justifica-se ainda mais que o sábado introduzia o ciclo das festas Judaicas que de facto estruturam todo o livro, seguindo o livro de Levítico 23:3 “Seis dias se fará trabalho, mas o sétimo dia é o sábado do descanso solene, uma santa convocação; nenhum trabalho fareis; é sábado do Senhor em todas as vossas habitações.”
Segundo a tradição bíblica, o sábado é o primeiro dia da festa com Deus celebrado pelo homem e a mulher (Génesis 2:1-3); é também o único dia cuja a ordenança foi dada antes mesmo da promulgação da lei no Sinai (ver Êxodo 16:23,29), e o único dia no qual a observância não depende nem das estações, nem dos astros, nem mesmo da história humana. É pois natural que se comece esta festa que terminará com a glória do povo e de Deus com o sábado.
É também provável que João se refira ao mesmo tempo a outro “dia do Senhor”, o Yom YHWH dos profetas hebraicos, que é designado igualmente no Antigo Testamento como dia do julgamento de Deus e do fim da história humana (Sofonias 1:7ss; 2:2,3; 3:8; Malaquias 3:2; 4:1,5; Joel 1:15; 2:1,2,11). Tal como no Novo Testamento (1ª Tes. 5:2; 2ª Tes. 2:2; 1ª Cor. 1:8; 5:5; 2ª Cor. 1:14; Fil. 1:6; 2:16), assim como na literatura hebraica (II Bar 48:47; 49:2; 55:6), que é contemporânea, a expressão “dia do Senhor” aplica-se a parousia de Cristo ou à vinda do Messias. O contexto imediato da nossa passagem sustenta esta interpretação. Sem falar do facto que esta associação entre o sábado e o dia escatológico da esperança é fortemente atestado na Bíblia. Devemos ainda salientar que o sábado é compreendido muitas vezes como o sinal do grade dia de libertação e do Reino futuro (ver Hebreus capítulos 3 e 4).
Por outro lado, João teria tido a sua visão do dia do Eterno (dia do julgamento final e da vinda de Jesus). Encontramos a mesma coincidência no livro de Daniel, quando o profeta recebe a visão de uma cerimónia de Kipur no contexto, ou tempo em que o profeta se encontrava no Yom Kipur (Dia da Expiação). Portanto não seria de admirar que o mesmo método de comunicação seja utilizado nos dois textos. Até, porque um e o outro se referem à mesma visão do Sacerdote com olhos de fogo e vestes de linho.
Mas João é surpreendido no seu próprio espaço. A palavra surpreende-o de imprevisto vindo detrás. A experiencia de João assemelha-se aqui à de Maria Madalena junto ao sepulcro. Por duas vezes, ela tinha voltado para descobrir quem lhe tinha falado (João 20:14,16). Ela cria que Jesus estava morto e procurava-O no túmulo, e a voz do Ressuscitado chega-lhe de surpresa, como a João, do outro lado, por detrás dela.
Uma outra intenção do texto é a de fazer perceber esta voz como vinda do futuro; porque, no pensamento hebraico, o passado é visto da frente, enquanto que o futuro é esperado de trás, é o que vem depois (a palavra hebraica quedem significa “o que está adiante” Salmo 139:5, designa por consequência o que é mais antigo, o passado; a palavra ahar significa “detrás”, e quer dizer o que vem depois, o futuro).
Moisés, aquando da sarça ardente, tinha percebido a mesma definição de Deus do futuro: “Aquele que se chama ´Eu serei´me enviou a vós.” (Êxodo 3:14). E esta forma do futuro reencontra-se até no próprio nome YHWH (Ele será). E esta é uma mensagem poderosa, Deus é sempre o que estará presente no momento de necessidade.
Como para Maria Madalena, para Moisés e os Israelitas do Êxodo, a palavra do Altíssimo surpreende João, a voz de Jesus ressuscitado é presente, mas não deixa de ser também a voz de Deus que ressoará no futuro. Ela é a voz sempre presente e sempre futuro.
Este dia “santificado” pelo Senhor no Éden foi-o no passado, é-o no presente e será no futuro (Isaías 66:22,23).
Em que dia foi João surpreendido?
Responda com a Bíblia na mão. Amem.

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